segunda-feira, 28 de março de 2016

Críticas ao Liberalismo e Libertarianismo


'“O conservadorismo é a arte de expandir e fortalecer a aplicação dos princípios morais e humanitários tradicionais por meio dos recursos formidáveis criados pela economia de mercado. O liberalismo é a firme decisão de submeter tudo aos critérios do mercado, inclusive os valores morais e humanitários. O conservadorismo é a civilização judaico-cristã elevada à potência da grande economia capitalista consolidada em Estado de direito. O liberalismo é um momento do processo revolucionário que, por meio do capitalismo, acaba dissolvendo no mercado a herança da civilização judaico-cristã e o Estado de direito.” (CARVALHO. Olavo/ Por que não sou liberal/ Jornal do Brasil, 8 de março de 2007)

A introdução epigráfica exposta acima é uma exposição conceitual básica a respeito das diferenças entre o conservadorismo e o liberalismo na perspectiva de um conservador. Aqui, o objetivo principal é estabelecer uma crítica à linha de pensamento liberal-libertária tendo em vista o comportamento do sujeito liberal e sua participação histórica.

A equiparação que se faz a respeito do conservadorismo e do liberalismo é posta em um quadro ideológico direitista. Põe-se as duas vertentes no mesmo quadro e as distinguem dentro dele, se distanciando então do outro onde é comportada uma suposta esquerda revolucionária ou progressista, que possui maior representação partidária no cenário congressista brasileiro, gerando uma democracia sempre cambaleante. A distinção que se faz a partir destes conceitos comuns a respeito da dicotomia “direita x esquerda” se resume em uma maior ou menor participação do Estado na economia e na vida privada; o que faz com que o liberalismo e o conservadorismo sejam enquadrados como reacionários. 

Todavia, devemos nos atentar para o fato de que a história revela o pensamento liberal sendo de esquerda, pois houve a tentativa de mudanças de determinadas estruturas sociais promovidas pelo pensamento iluminista que, por exemplo, por meio de revoluções, se opuseram a instituições educacionais religiosas e promoveram a promulgação da laicidade do Estado. Verificamos os precursores teóricos das grandes revoluções que marcaram o Ocidente com uma reviravolta cultural maciçamente carregada de um histórico violento com direito a execuções periódicas de cidadãos para que servissem de exemplo. O ambiente iluminista não pode ser marcado, em nenhum aspecto, como reacionarista conforme o pensamento genérico-popular taxa já que regimes monárquicos da Europa foram depostos por meio de reconhecidas revoluções liberais, não reformas difundidas pelo conservadorismo em si.
O grande filósofo e político irlandês Whig Edmund Burke (Dublin, 12 de janeiro de 1729 — Beaconsfield, 9 de julho de 1797) foi estreante do pensamento conservador de reação às revoluções ocorridas na Europa, principalmente a Francesa, que desencadearam uma profunda crise social e cultural. Critica-se então o modelo de sociedade ideal estabelecida pelos revolucionários da época, critica-se o universalismo do homem estabelecido pelas constituições liberais. Joseph de Maistre (Saboia, 1 de abril de 1753 — 26 de fevereiro de 1821), escritor, filósofo, advogado e diplomata francês, influente para a linha de pensamento contrarrevolucionária ultramontanista já escreveu:

“A Constituição de 1795 (...) foi feita para o homem. Ora, não existe homem no mundo. Tenho visto na minha vida franceses, italianos, russos, etc., mas quanto ao homem declaro nunca o ter encontrado na minha vida".

Também há a crítica do austríaco Klemens Wenzel von Metternich (Coblença15 de maio de 1773 —Viena11 de junho de 1859) :
            
“Um povo que não sabe ler nem escrever, cuja última palavra é o punhal - belo material para princípios constitucionais!... A constituição inglesa é a obra de séculos... (Não há uma receita universal para constituições)”.

A partir desta crítica inicial estabelecida sob o ponto de vista conservador, podemos agora passar a algumas características históricas a respeito do iluminismo. Como atualmente, tanto em âmbito conservador quanto liberal nacional, defende-se a mínima intervenção do estado na educação, na economia e em outros aspectos da vida privada, estabelecendo, mais uma vez, a confusão conceitual de que foram os socialistas e seu totalitarismo estadista que fundamentaram a questão da educação como prioridade do Estado e a iniciaram com um processo de desintegração e difamação da religiosidade. No seio do liberalismo, é possível ver o surgimento do marxismo.
É mais que evidente que, na revolução francesa, líderes como Marrat e Robespierre, propuseram, em meados do acontecimento, para a separação do Estado da igreja, uma descristianização da política e da pedagogia, atribuindo esta a um dever obrigatório do governo a perseguir membros do Clero, desmoralizando-os ao depredar edifícios destinados à prática religiosa e etc. Inclusive, Noël Babeuf (Saint-QuentinPicardia23 de novembro de 1760 — Paris27 de maio de 1797), integrante dos jacobinos, foi um apresentador de propostas socialistas de teologia utópica, na qual o Estado deveria ser um distribuidor de riquezas. Entretanto, sua linha de pensamento nunca adquirira uma ampla adesão como a do socialismo marxista, não fora respeitada por um período relativamente longo[1].

Com o surgimento do pensamento contrarrevolucionário ao longo da história do liberalismo, a vigência do pensamento liberal iluminista na Europa e com a ascensão de uma “nova esquerda” socialista-marxista, formam-se complicações pragmáticas que tornam a conceituação de cada posicionamento político algo maleável e inconstante. O que nos vale agora é criticar, como conservadores, todo comportamento liberal onde é vigente o partidarismo esquerdista que define a direita brasileira por formações prototípicas cujo pensamento de livre-mercado passa a ser mais valorizado em âmbito congressista a partir dos meados de 2015 de forma reacionária, após os maiores escândalos de corrupção e ineficácia proveniente do estadismo apenas.

Para os liberais, tomar a liberdade como um fundamento da convivência social por meio de uma constituição universal é um aspecto admirável, todavia, tomar a liberdade como um princípio para a convivência social não é viável. O que esse chavão miserável quer dizer?


[1] Inclusive ainda, Babeuf fora líder do movimento da Conspiração dos Iguais, no entanto, este fora dissolvido pelo Diretório, um movimento responsável pela elaboração da nova Constituição, a Constituição do Ano III, que defendia os interesses da burguesia comercial de duas ameaças: A república democrática Jacobina e o antigo regime.
A liberdade individual só é concebível enquanto compreendida dentro da sociedade como “uma norma pragmática de aplicação limitada“ [2], ou seja, o conceito de liberdade depende dos padrões morais e culturais de uma determinada sociedade, que se entende como uma tendência natural do ser humano; a liberdade é concedida pelo consenso em prol do bem estar social. Este é um momento em que é bastante interessante remetermos a uma alegoria de Schopenhauer: As dos porcos espinhos. Esta nos conta que em uma zona glacial remota em um local qualquer do globo terrestre, havia um pequeno grupo de porcos espinhos enregelados sob a friagem que cobria o território. Todos, pelo ofício dos sentidos, tinham conhecimento de que seus corpos possuíam uma temperatura própria, capaz de aquecê-los por determinado tempo durante aquele clima hostil. Sabendo disso, todos os membros do grupo resolveram se aproximar para que pudessem desfrutar de um calor mútuo fornecido por todos os corpos, no entanto, seus espinhos eram demasiado incômodos para que permanecessem juntos e se remexessem sem que se machucassem, e todos voltaram a se afastar. Sentindo frio novamente, resolveram se aproximar, fazendo com que ocorresse o mesmo problema, e este procedimento pendular fora mantido até que pudessem ficar próximos a uma distância razoável, onde ainda havia a problemática do clima, mas todos podiam compartilhar do calor corporal de forma moderada sem que os espinhos os incomodassem.

Os signos que podemos apreender são de óbvia dedução. Os porcos-espinho são os sujeitos, os espinhos e o calor próprio são suas atribuições pessoais que podem ser contribuintes para a manutenção ou dispersão do conjunto, a distância entre eles estabelecida representa o conjunto de paradigmas morais regidos por padrões normativos necessários e o ambiente onde se encontram são as condições gerais em que a sociedade precisa se adaptar. Todas as imagens podem ser então visadas como uma característica natural do ser humano, que faz com que a liberdade seja limitada por sua própria natureza.
Se todos soubessem que a liberdade de um termina onde começa a do próximo, tanto infringir a propriedade privada quanto agir com plena indiferença moral com relação à sociedade, já seria o princípio da libertinagem. Afirmar que o Estado não pode intervir, sob qualquer aspecto, na liberdade privada, ou seja, que todo indivíduo possui o direito de agir como bem entender desde que não afetem a vida de terceiros, se utilizando disso como norma moral junto aos padrões de livre mercado, é ser da direita conservadora. Caso inexistente, o liberalismo pode ser uma forma para que o sujeito liberal seja um instrumento para garantir a hegemonia da esquerda uma vez que o subjetivismo e a atomização do indivíduo são constantemente instigados por meio dos programas morais da esquerda (a ideologia de gênero, o casamento gay e a legalização da maconha são exemplos), para que se vá desagregando pouco a pouco a população de raízes culturais sólidas que se remetem aos intrínsecos valores judaico-cristãos e possam se estabelecer num relativismo moral onde “tudo o que é certo é o que favorece o bem estar”, para que se gere um ambiente propício ao marxismo-cultural e enfim, ao socialismo.

Se diferenciar da esquerda por defender a mínima intervenção do estado na economia não basta para ser “de direita”. Inclusive, é certo que o estado não deveria interferir na educação e nem nos setores comerciais, mas o que realmente importa não é a intervenção do estado em si, mas sim das ideologias que transitam por meio de suas instituições.

“Os ‘libertários’ nutrem uma crença ingênua de que toda vontade individual pode ser um juízo de valor respeitável e supremo. É por isso que muitos deles acatam teses como legalização do aborto, casamento homossexual, liberação das drogas, usando da premissa de que os valores, sendo subjetivos, só resta a cada individuo escolher, independentemente das suas conseqüências. O culto do livre mercado é contrastado com o esvaziamento ético e moral das relações humanas e da natureza da própria sociedade política democrática. A conseqüência lógica deste pensamento é o esvaziamento ético e moral da democracia e das relações políticas. E, por conseguinte, a destruição da própria democracia pelo niilismo mais assombroso da carência de valores morais. A concepção “libertária” é, no fundo, totalitária, pra dizer o mínimo!”[1]

[1] Olavo de Carvalho

A liberdade não é um princípio estruturador da sociedade, uma organização vai de contra o conceito de liberdade quando esta é tomada como princípio. Portanto o princípio organizador da sociedade preserva a liberdade dentro de uma série de paradigmas culturais.

Afirmar também ser um defensor do livre mercado é uma falácia uma vez que o livre-mercado é objetivo de todos os regimes do planeta em determinados momentos, o último objetivo dos comunistas é a estatização completa e a liberdade é uma palavra comum em seus primeiros discursos. Todos necessitam da liberdade de mercado porque compreendem que ela é necessária para manter a economia em funcionamento, seus principais alvos hoje em dia são encontrados nas esferas socioculturais, pois a doutrinação ideológica necessita ser efetiva e de uma instrumentação eficaz que se paute sobre a égide da liberdade individual tomada como princípio. Logo, parece que um libertário em partida de seu niilismo funciona como elemento instrumental da esquerda na esfera cultural. 

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